A simples figura de um poeta de voz firme e segura nos leva junto sem decifrar sinais
O olhar presente nos leva a viajar em seus mais delicados gestos que vivenciou a vida em seus mais variados sentidos
Perto de você o canto se torna mundo
A cerveja muda de gosto pelo som de suas palavras
E a vida do poeta, pensamos se resumir ali, mas vai além do final do arco-íris
A tinta no papel que minhas mãos jamais alcançarão, você derrama serenamente
O papel, que muitos não entendem, pode ser um caminho do meu coração
Os anos de sabedoria me faz duvidar de vocabulários e sentimentos, meus e do poeta
A casca muda, mas o interior, nem sempre. O poeta é constante. A poesia existe
Pelo menos para os que entendem, estando vivos ou não.
Se eu dormisse, essa noite,
sonharia os sonhos mais tristes,
essa noite.
Sonharia,
por exemplo,
que Pablo Neruda está morto
e que a poesia foi abolida
do caminho de Santiago
por ordem expressa do general.
E sonharia
que, em algum lugar,
uma flor encarnaria em mulher
chora a morte de um homem justo
que todos chamavam Salvador.
E, sonharia
que para o lado do poente
as baionetas brilham na noite
a procura de homens e mulheres que,
além do sangue,
carregam um sonho vermelho.
E sonharia
que da boca da noite
sai pólvora e fumaça,
e que ninguém mais passeia
de mãos dadas aos pés do Andes.
E sonharia
que cápsulas de aço
fazem homens e mulheres
dormirem na noite,
na terrível noite das cordilheiras,
ainda indecisas,
em serem montanhas de gelo
ou de espanto congelado.
E sonharia
que tanques de guerra
saltam atônitos aos olhos do mundo,
enquanto uma grande ferida sangra
nas costas da América
Porque em território chileno,
pacífico
é apenas o nome do oceano
escrito no beiral azul do mapa.
Goiânia, 23/09/1973 – Noite Chilena - Leônidas Arruda